Veja esta matéria na íntegra na Edição #5 da REVISTA OVERLANDER
Quando se pensa em viajar de carro, o primeiro veículo que vem à cabeça da maioria das pessoas é um carro robusto, forte, 4×4, que aguente o tranco. Mas não é bem assim, o mais importante em uma “viagem dos sonhos” não é o veículo mas sim o estilo, vontade e atitude. Conheça a história de três casais que desbravam o mundo com seus carros antigos, mais que especiais!
CONQUISTANDO O MUNDO – Caçadores de Sonhos
Texto & Imagens: Linho Bergamin e Vanessa Zandoná Sartori
INSANIDADE PLANEJADA
Agosto de 2011, com muito trabalho e orgulho consegui atingir R$ 30.000,00 de economias, estava com 31 anos, meu único bem material era um Fiat Palio 2005 e foi neste ano que cometi três insanidades de uma só vez.
1ª insanidade: Comprei um Jeep SW 1946 de um acervo de um museu particular da aeronáutica da II Guerra Mundial em Videira/SC — paguei R$ 12.000,00.
2ª insanidade: Decidi que iria colocar um bom motor diesel no Jeep e comprei um MWM 2.8 turbo mecânico, por R$ 18.000,00.
3ª insanidade: Lá se foram os R$ 30.000,00 que levei 19 anos para economizar. Com a conta zerada, troquei o meu Palio mano a mano por uma Chevrolet S10 2001 batida, sem lataria e sem motor. Imaginem como ficou a garagem da casa do meu pai, era tranqueira de tudo que é lado.
Quando comprei o Jeep estava ao lado de minha mãe e perguntei a ela:
— E aí, o que achou do carro?
Ela me olhou e disse:
— Eu achei ele uma imperfeição.
Estava batizado o Jeep, o nome era perfeito. Buscamos constantemente a perfeição, em nosso trabalho, com nossa família, com nossos amigos, sempre queremos fazer as coisas da melhor maneira possível; agora, quando nos damos conta de que a tal felicidade fica mais próxima a partir do momento em que passamos a dar valor às coisas mais simples, às coisas que não são tão perfeitas, percebemos que o perfeito mesmo é a imperfeição.
Fiquei um ano a pé até fazer a Imperfeição rodar — foi em novembro de 2012, lembro que no dia 3 instalei a barraca no teto do Jeep e no dia 10, pela primeira vez, dei a partida no motor e dirigi o carro.
Detalhe, o Jeep veio antes da Vane — encontrei uma mulher que adora acampar, com o mesmo sonho de fazer uma grande viagem e ficou comigo mesmo estando a pé. Não tive dúvida, é a mulher de minha vida.
Nem em meus melhores sonhos imaginaria que após cinco anos estaria ao lado da Vane, em nossa festa de casamento, com a Imperfeição como decoração da boda, cronômetro em contagem regressiva para sair da festa e iniciar uma volta ao mundo.
Foram cinco anos para construir e adaptar o Jeep, durante finais de semana e feriados. Contava com a minha mão de obra, parceria total da Vane e incentivo da família e amigos, que me ajudavam com as mais diversas dicas. Não sou mecânico, aprendi muito, foi bem difícil, sou muito otimista mas sempre digo que “nada dá certo de primeira”.
A Imperfeição é uma composição de peças das marcas Jeep, Chevrolet, Fiat, Volkswagen, Renault, Toyota, Ford, Mercedes e outras adaptações estranhas como a fôrma de bolo da minha cunhada que virou a pia, a bombinha de limpador de para-brisas que gera a pressão do chuveiro, o suporte do tambor da máquina de lavar roupa dos anos 80 que sustenta o cabo de força (para ligar o carro à rede elétrica), os tubos de PVC 250 mm que viraram caída d’água e polias de moinho de milho que calçam a base do volante do carro.
O painel frontal e superior, portas traseiras, bagageiro, caixas d’água, suporte da pia e fogão e móveis projetei primeiramente em meu computador (software 3D) e depois parte por parte foi construída por mim ou por empresas de amigos que trabalham com corte laser e dobra de chapa, usinagem, pintura e móveis; na sequência, o desafio era montar as partes e fazer dar certo.
O dia em que comprei a Imperfeição gravei o seguinte áudio: “Hoje, 28 de agosto de 2011, eu cometi uma das maiores loucuras de minha vida. Comprei um Jeep 1946, não sei o que vou conseguir aproveitar nele, mas eu prometo, prometo sim, que um dia vou banhá-lo nas águas do Oceano Ártico”. Em 12 de agosto de 016, cinco anos depois, chegamos ao Oceano Ártico. Pensar neste momento me arrepia inteiro, só de lembrar quanto trabalho, planejamento, dedos cortados, queimaduras, dúvidas, momentos de exaustão, fé e muito, muito amor foram necessários para chegar lá.
A Imperfeição é da série 463 do primeiro modelo de carro com conceito SW (Station Wagon) com a carroceria de metal construído no mundo (antes existiam somente de madeira). Foi fabricada na cidade de Toledo, Ohio, EUA. Outro momento de êxtase ocorreu no dia 12 de outubro de 2016. Depois de 70 anos, levamos a Imperfeição de volta a sua origem, onde hoje resta somente uma das chaminés da antiga fábrica da extinta Willys Overlander.
O modo pelo qual este carro foi “concebido” torna-o único, com vida, com sangue e óleo que percorrem seus dutos caçando os nossos maiores sonhos.

Veja esta matéria na íntegra na Edição #5 da REVISTA OVERLANDER